Relutante, fui até o telefone. O número ainda lembrava de cabeça, o que me incomodava fortemente. Por que não consegui esquecer? Acho que da mesma forma que não consegui esquecê-la... Um toque... Para que exatamente eu estava ligando? Pensei em diversos motivos, mas era inegável que apenas queria ouvir sua voz e vê-la mais uma vez... Dois toques... Que desculpa usar? Saudades? Poderia ser mal interpretado. Quem precisa se preocupar com interpretações?!... Três toques... Isso estava começando a ficar ridículo. Eu deveria ter pensado antes de lig...
- Alô
- Er... Oi! Poderia falar com ***?
- É ela mesma. Quem ta falando?
- Sou eu, Pedro.
- Que Pedro?
- Como assim “Que Pedro?”. Você mesma já disse que o único Pedro que conhecia era eu.
- Ah! Desculpa. Tava meio desligada... Mas e aí, por que está ligando?
- Queria saber como você estava...
- Por que isso de repente?
- Sei lá... Há muito tempo que a gente não se fala, né?
- Verdade. E eu estou muito bem. E voc...
- Alguma novidade da sua empolgante vida? (O tom não deveria ter saído irônico. Merda!)
- ... Ah... Acho que nada não. Terminei com meu namorado há umas semanas (Yay!), já estou estudando para o vestibular... Acho que só. E você o que me conta?
- Na mesma de sempre. Acho que mesmo depois de alguns meses você saberia dizer. (Eu sou um idiota)
- Hum... (Ela deve achar o mesmo. E com razão)
- Na verdade não me sinto à vontade conversando por telefone. Você sabe como é, né?
- Sei? Devo saber se você diz... (Argh!)
- Queria ver se a gente podia sair amanhã.
- Amanhã? Não sei... Acho que não vai dar.
- Ah! Faz um esforço aí.
- Posso ver, mas não garanto nada.
- Pode ser alguma coisa à tarde só pra gente conversar mesmo. Um cinema talvez...
- Conversar e cinema na mesma frase? Você? Ainda mais você! (Bela fama que eu tenho)
- A gente se encontra pelo centro de Niterói e decide o que fazer. Que tal? Eu saio do estágio e vou direto.
- Vou ver...
- Já disse que vou ver!
- Que horas poderia ser isso?
- Sei lá. Você que sabe.
- Uma e meia, que tal?
- Tá bom.
- Então amanhã uma e meia na frente da estação de barcas, ok?
- Ok. Eu ligo pra confirmar.
- Preciso desligar agora. Beijos!
- ... Beijos!
Por que eu acho que isso funciona? Nunca adiantou de nada. Mas as coisas poderiam mudar e em poucos dias eu comprovaria isso. Minha vida passaria a ser feliz como jamais fora antes.
E na sexta foi imensamente eufórico que saí do estágio. Mesmo passando mal, estava animado com o dia, tudo daria certo. *** costumava se atrasar pelo menos meia hora em qualquer tipo de encontro. Apesar de saber disso cheguei lá na hora. Aproveitei o belo dia que estava fazendo para ir de barca. Nada poderia ser melhor. Cheguei por volta de uma e meia. Ansiedade é isso. Como sabia que ela ia demorar procurei uma das diversas bancas de jornal para passar o tempo. Comecei a folhear uma revista. Não comprei por não ter dinheiro e isso era o máximo que poderia fazer até segunda. Uma e cinqüenta. Ela deveria estar chegando. Melhor ficar no ponto que nos encontrávamos normalmente. Pessoas passavam indiferente à minha ansiedade. Confesso que me incomodava o fato de passarem e não vir dizer coisas como “Vai dar tudo certo. Ela já está vindo!” ou “Fica calmo. O ônibus dela é o próximo.”. E minha atenção era totalmente voltada para as pessoas. Nada de música, sem fones de ouvido. Duas e dez. Um atraso um pouco maior que o normal, nada preocupante. Minha garganta ainda doía um pouco graças aos meus constantes acessos de tosse. Talvez uma virose. Ao menos conseguia respirar normalmente e minha voz já havia voltado ao normal. Quando voltasse para casa deitaria para descansar e ficaria relembrando aquela ótima tarde de com ***. Mas enquanto isso esperava em pé na sombra projetada pela marquise da estação das barcas. Duas e meia. Uma hora de atraso! Isso já estava cansando... E meu telefone tocou. Era ela.
- Alô!
- Pedro?
- Sim?
- Estou ligando pra dizer que não vai dar pr’eu ir. Marquei de ir na casa de uma amiga hoje à tarde e tinha esquecido.
- Ah sim. Não... Tranqüilo. Eu saí um pouco mais tarde do estágio e ainda estou no Rio esperando um ônibus pra Niterói. Estava até preocupado em ter deixado você esperando.
- Que bom! Bem... Depois a gente se fala, tá? Beijo!
- Tchau...
Nada mudou.